De quem são os meninos de rua?
Eu, na rua, com pressa, e o menino segurou no meu braço, falou qualquer coisa que não entendi. Fui logo dizendo que não tinha, certa de que ele estava pedindo dinheiro. Não estava. Queria saber a hora.
Talvez não fosse um Menino De Família, mas também não era um Menino De Rua. É assim que a gente divide. Menino De Família é aquele bem-vestido com tênis da moda e camiseta de marca, que usa relógio e a mãe dá outro se o dele for roubado por um Menino De Rua. Menino De Rua é aquele que quando a gente passa perto segura a bolsa com força porque pensa que ele é pivete, trombadinha, ladrão.
Ouvindo essas expressões tem-se a impressão de que as coisas se passam muito naturalmente, uns nascendo De Família, outros nascendo De Rua. Como se a rua, e não uma família, não um pai e uma mãe, ou mesmo apenas uma mãe os tivesse gerado, sendo eles filhos diretos dos paralelepípedos e das calçadas, diferentes, portanto, das outras crianças, e excluídos das preocupações que temos com elas. É por isso, talvez, que, se vemos uma criança bem-vestida chorando sozinha num shopping center ou num supermercado, logo nos acercamos protetores, perguntando se está perdida, ou precisando de alguma coisa. Mas, se vemos uma criança maltrapilha chorando num sinal com uma caixa de chicletes na mão, engrenamos a primeira no carro e nos afastamos pensando vagamente no seu abandono [...].
COLASANTI, Marina. A casa das palavras. São Paulo: Ática, 2006. p. 40. (Fragmento). © by Marina Colasanti.
Das afirmações seguintes:
I. O que mais surpreende a narradora quanto a divisão de classes entre os meninos, é a atitude das pessoas em relação aos meninos de rua: o fato de elas não se comoverem com o abandono dessas crianças como se comoveriam com o abandono de uma criança “de família”.
II. No trecho “Como se na rua, e não uma família, não um pai e uma mãe, ou mesmo apenas uma mãe os tivesse gerado” a conjunção e em destaque expressa oposição.
III. No trecho “Como se na rua, e não uma família, não um pai e uma mãe, ou mesmo apenas uma mãe os tivesse gerado” a conjunção OU introduz a alternativa de que uma mãe apenas poderia ter gerado os meninos de rua, exprimindo a exclusão do pai e também de uma família.