O nu se banalizou
Levei um susto quando soube que a principal revista de nus femininos brasileira vai sair de circulação. E que a Playboy americana abriu mão de publicar mulheres nuas. O nu não aumenta a venda de revistas nem atrai publicidade. É engraçado, porque venho de uma época em que o sonho de toda starlet era posar nua e comprar um apartamento. Ok, sou bem mais antigo que isso. Sou do tempo em que aparecer nua em revista ou filme era uma vergonha para a família. Durante a ditadura militar – não podemos esquecer que ela aconteceu –, as revistas eram duramente censuradas. Na capa, eu me lembro, podia mostrar o bico de um seio. Não dois. Qual a loucura da cabeça de quem criou essa regra não consigo imaginar. Por que dois bicos destruiriam a família brasileira e um só não? Mais tarde, o nu faturava no ramo editorial e no cinema (nas antigas pornochanchadas que, aos olhos de hoje, eram comportadíssimas). As fofocas circulavam. Uma certa atriz, já de idade, aceitou posar (está ainda por aí, sempre fazendo a ousada). O truque era cruzar as mãos embaixo da cabeça, para erguer os seios. Mas suas costas e seu rosto foram repuxados com fita-crepe. A pele, esticadíssima. Na época não existia Photoshop, mas examinavam-se as primeiras provas de imagem e marcava-se com a caneta cada ruguinha a ser tirada. E um profissional raspava com lâmina, corrigia a foto até o corpo da bonita ficar lisinho. Os leitores se admiravam.
– Nessa idade, ainda está inteiraça!
Pois é. Não estava. Nem ela nem outras que continuam estando. Milagre não existe.
Hoje, basta abrir a internet e há um universo de peladas, de todos os tipos, para todos os gostos. Existem sites específicos, de prostituição, mas não é deles que estou falando. Exibir-se faz parte da vida moderna, eis tudo. Ontem, entrei no Instagram. Entre as sugestões de pessoas para seguir, havia uma “gatinha” quase nua. Olhei suas fotos. Belíssima. Sensual. Milhares de curtidas. Está se tornando uma celebridade da internet. Simples assim.
Outro dia um amigo veio mostrar a foto da filha, de 6 anos. É uma garota bem bonita. Mas o que fazia de top de oncinha, bermuda jeans e perninha erguida? Perguntei:
– Está educando sua filha para ser periguete?
Ele ficou sem jeito, estava orgulhoso da foto. Os pais acham que aparecer é um caminho para ganhar bem, fazer sucesso, enriquecer. Qual é o jeito mais fácil? Arrancar a roupa, aparentemente. Não vi nenhum ganhador de Prêmio Nobel ter milhões de seguidores no Instagram. Peladas, sim. As filhas são educadas para arrancar a roupa o mais rápido possível. Só que são tantas que, simplesmente, isso se banalizou. Certa vez, uma atriz fora da mídia apareceu nua numa praia. Disse que fora assaltada, e os ladrões levaram... o biquíni! Fez escândalo, chorou. Assim como outra, na movimentada Praia do Leblon, no Rio de Janeiro, à tarde, fez topless. E depois reclamou dos paparazzi.
– Não tenho direito à intimidade!
Os pais tentam resguardar os filhos, controlando o acesso aos computadores. Mas adianta? O nu e até fantasias bizarras estão aí, para qualquer um ver. O adolescente esperto, que entende mais de tecnologia que seus pais, entra nos sites e vê. Na minha modesta opinião, já nem fica chocado. É normal. Pode achar uma garota mais bonita que a outra e só.
Daqui a pouco, não haverá mais graça em ver alguém pelado. Talvez, sim, seja curioso admirar gente vestida. Também é fato que o nu proliferou, aconteceu, e a família brasileira continua aí. Não foi destruída, como previa a ditadura militar.
A única coisa que me deixa curioso em toda essa história é por que o topless ainda continua proibido nas praias brasileiras. Mais ainda, por que o nudismo não se torna normal, cotidiano? Garanto, ninguém vai se assustar. Talvez só com minha barriga, se eu me atrever.
(Disponível em: Acesso em: 11 dez. 2015. Adaptado.)
Assinale a alternativa em que o termo à direita mantém o mesmo sentido do destacado no enunciado.