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2021
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A morte e a morte do poeta

          Ao ler o seu necrológio no jornal outro dia, o pianista Marcos Resende primeiro tratou de verificar que estava vivo, bem vivo. Em seguida gravou uma mensagem na sua secretária eletrônica: “Hoje é 27 e eu não morri. Não posso atender porque estou na outra linha dando a mesma explicação”. Quando li esta nota, me lembrei de como tudo neste mundo caminha cada vez mais depressa. Em 1862, chegou aqui a notícia da morte de Gonçalves Dias.
          O poeta estava a bordo do Grand Condé havia cinquenta e cinco dias. O brigue chegou a Marselha com um morto a bordo. À falta de lazareto, o navio estava obrigado à caceteação da quarentena. Gonçalves Dias tinha ido se tratar na Europa e logo se concluiu que era ele o morto. A notícia chegou ao Instituto Histórico durante uma sessão presidida por d. Pedro II. Suspensa a sessão, começaram as homenagens ao que era tido e havido como o maior poeta do Brasil.
          Suspeitar que podia ser mentira? Impossível. O imperador, em pleno Instituto Histórico, só podia ser verdade. Ofícios fúnebres solenes foram celebrados na Corte e na província. Vinte e cinco nênias saíram publicadas de estalo. Joaquim Serra, Juvenal Galeno e Bernardo Guimarães debulharam lágrimas de esguicho, quentes e sinceras. O grande poeta. O grande amigo. Que trágica perda. As comunicações se arrastavam a passo de cágado. Mal se começava a aliviar o luto fechado, dois meses depois chegou o desmentido: morreu, uma vírgula. Vivinho da silva.
          A carta vinha escrita pela mão do próprio poeta: “É mentira. Não morri, nem morro, nem hei de morrer nunca mais.” Entre exclamações, citou Horácio: “Não morrerei de todo.” Todavia, morreu, claro. E morreu num naufrágio, vejam a coincidência. Em 1864, trancado na sua cabine do Ville de Boulogne, à vista da costa do Maranhão. Seu corpo não foi encontrado. Terá sido devorado pelos tubarões. Mas o poeta, este de fato não morreu.
          [...]

(Adaptado de: RESENDE, Otto Lara. Bom dia para nascer. São Paulo: Cia das Letras, 2011, p.107-8)
 
A frase cuja REDAÇÃO está inteiramente clara e correta é:
A
Para quem acredita em destino e que o dia da morte está marcado, nada nem ninguém pode alterá-la ou prolongá-la, e nenhum remédio poderia ser proscrito para salvar aquele que já está condenado.
B
Não foi absolutamente efêmera há glória de Gonçalves Dias, mas ao contrário duradoura e imperecível, já que ainda hoje o autor da “Canção do exílio” é considerado um dos maiores poetas brasileiros de que conhecemos.
C
Outra extraordinária coincidência na biografia de Gonçalves Dias é a composição de um poema chamado “O mar”, em cujos versos aquele que viria a morrer num naufrágio alude ao “oceano terrível” e à própria morte.
D
Senão tivesse morrido no naufrágio do Ville de Boulogne, é possível que Gonçalves Dias não sobreviveria muitos dias à seu desembarque, pois seu estado de saúde era de fato muito grave.
E
Ser dado por morto e estar bem vivo, numa experiência das mais inquietantes que o ser humano pode vir a conhecer, cuja é talvez ainda mais terrificante quando se depara de repente com a notícia da própria morte.