Texto I - a personagem-narradora conta sobre a triste realidade das crianças brasileiras que precisam trabalhar. No texto II, Meninos Carvoeiros, o poeta Manuel Bandeira também aborda a temática do trabalho de crianças que trabalham em carvoarias.


OS FILHOS DO CARVÃO

Aposto que você não sabia que o carvão é a lenha do eucalipto queimado em fornos chamados “rabos quentes”, sabia? E, se não sabia disso, também não deve saber que rabo quente é uma espécie de iglu (já viu como é a casa do esquimó?), feito de tijolo e barro, que arde e estala com o fogo aceso durante três dias.
Pois é. Só que, para fazer o eucalipto virar carvão, muitas crianças têm que trabalhar junto com os pais. Quem contou e até mostrou tudo isso para a minha professora foi a Luciane, uma menina de 15 anos, que vive numa fazenda em Água Clara (no Mato Grosso do Sul). Ela tem mais dois irmãos adolescentes e duas irmãs pequenas. Todos trabalham com o pai numa carvoaria. Escute só o que mais ela falou:
“O médico me proibiu de mexer com fumaça, pois já tive pneumonia. Mas meu pai não aguenta trabalhar sozinho. Desde os 7 anos eu ajudo ele. Comecei fazendo porta de forno, depois aprendi de tudo. Tem de transportar a lenha, botar fogo, esperar esfriar e retirar o carvão. Tem tanta coisa para se fazer numa carvoaria que, de noite, a gente dorme até em pé.”
Agora, pare um pouco e pense como deve ser horrível a gente não poder deitar em uma cama macia, cheirosa e quentinha, ainda mais quando está caindo de cansado. Pois é... Esta história dos filhos do carvão só tem fumaça e tristeza. Se eu fosse pintar, só usaria o lápis cinza. E o preto também, claro, pra pintar o carvão e o “gato”.
Sabe o que é esse gato preto entre aspas? É o empreiteiro, o homem que contrata os carvoejadores e depois leva todos para morar em barracas, dentro das florestas onde estão os eucaliptos que vão virar carvão. É ali, no meio da fumaça e longe da cidade, que famílias como a de Luciane vivem. E não é só em Água Clara. A Dona Catarina disse que também em Minas Gerais, na Bahia e no Pará.
Esta história cinza-triste me fez lembrar de amarelinha. É que minha mãe sempre me dá um pedaço de carvão quando eu quero riscar uma amarelinha na calçada. É melhor que giz, porque o preto aparece mais.
Será que essas crianças do carvão já brincaram alguma vez de amarelinha?
MENINOS CARVOEIROS

Os meninos carvoeiros
Passam a caminho da cidade.
- Eh, carvoero!
E vão tocando os animais com um relho enorme.
Os burros são magrinhos e velhos.
Cada um leva seis sacos de carvão de lenha.
A aniagem é toda remendada.
Os carvões caem.
(Pela boca da noite vem uma velhinha que os recolhe, dobrando-se com um gemido.)
- Eh, carvoero!
Só mesmo estas crianças raquíticas
Vão bem com estes burrinhos descadeirados.
A madrugada ingênua parece feita para eles...
Pequenina, ingênua miséria!
Adoráveis carvoeirinhos que trabalheis como se brincásseis!
- Eh, carvoero!
Quando voltam, vêm mordendo num pão encarvoado,
Encarapitados nas alimárias,
Apostando corrida,
Dançando, bamboleando nas cangalhas como espantalhos
[desamparados!
BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira. 25 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.
A intertextualidade encontra-se presente entre os textos (Os filhos do carvão e Meninos Carvoeiros). Com base no entendimento dos dois textos, marque a alternativa CORRETA.