Sabe aquele que ri no velório? Não é ele.
É fácil identificar um humorista. Num velório, por exemplo. Em qualquer velório tem sempre uma pessoa rindo. Todos estão tristes, ou pelo menos fingindo que estão tristes, mas um está rindo, ou pelo menos se esforçando para não rir. Não, não é ele o humorista. Também não é o que está ao seu lado, dizendo coisas que provocam o riso. Humorista é quem nota a cena. Porque humorista é isso: é o que se dá conta. O que vê a incongruência, percebe o insólito, registra o inusitado, flagra a anomalia e identifica o cômico. Como ninguém. O que está rindo no velório tem senso de humor, mas não basta entender piadas para ser humorista. O que está ao seu lado fazendo-o rir obviamente sabe contar piadas, mas não basta ser engraçado para ser humorista. O verdadeiro humorista não precisa nem ter senso de humor nem saber contar piadas. Precisa, isto sim, ter a sensibilidade para o momento revelador, para o detalhe que na hora os outros não dão importância, e sua relação com o contexto.
No nosso hipotético velório alguns se indignariam com o riso fora do lugar, alguns até fariam “Sssh”, outros nem ligariam, outros também achariam engraçado. Mas só o humorista guardaria a cena para usar depois. Humorista é isso: é o que guarda a cena.
(Luis Fernando Veríssimo. In: O melhor do Almanaque Brasil de cultura popular. Curitiba: Positivo)
De acordo com o texto, é possível afirmar que: