SUGESTÃO
Sede assim – qualquer coisa
serena, isenta, fiel.
Flor que se cumpre,
sem pergunta.
Onda que se esforça,
por exercício desinteressado.
Lua que envolve igualmente
os noivos abraçados
e os soldados já frios.
Também como este ar da noite:
sussurrante de silêncios,
cheio de nascimentos e pétalas.
Igual à pedra detida,
sustentando seu demorado destino.
E à nuvem, leve e bela,
vivendo de nunca chegar a ser.
À cigarra, queimando-se em música,
ao camelo que mastiga sua longa solidão,
ao pássaro que procura o fim do mundo,
ao boi que vai com inocência para a morte.
Sede assim – qualquer coisa
serena, isenta, fiel.
Não como o resto dos homens.
(MEIRELES, Meireles. Mar absoluto. In: Obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1987, p. 228-9)
I. Quanto ao gênero, o poema é indiscutivelmente lírico; mas isso não o isenta de caracterizar-se, tipologicamente, como um texto injuntivo, com marcante presença da função conativa ou apelativa da linguagem.
II. O sujeito das orações que compõem, respectivamente, a primeira e penúltima estrofes do poema é de segunda pessoa do plural.
III. No poema, sugere-se ao sujeito da forma verbal sede que procure igualar-se, metaforicamente, à flor, à onda, à Lua, à pedra, à nuvem, à cigarra, ao camelo, ao pássaro, ao boi; todavia, essa sugestão não opera metaforicamente em relação ao ar da noite.
IV. O sentido de frios, no último verso da quarta estrofe, deve ser compreendido, conotativamente, como sinônimo de mortos.
V. Os travessões presentes no texto podem ser substituídos por dois-pontos sem alteração no sentido original das estrofes.
verifica-se que