Questão
2015
FURB
Prefeitura Municipal de Benedito Novo (SC)
Fiscal de Posturas (Pref Benedito Novo/SC)
2015
FURB
Prefeitura Municipal de Benedito Novo (SC)
Fiscal de Tributos (Pref Benedito Novo/SC)
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A OVELHA NEGRA

     Havia um país onde todos eram ladrões.
     À noite, cada habitante saía, com a gazua* e a lanterna, e ia arrombar a casa um vizinho. Voltava de madrugada, carregado e encontrava a sua casa arrombada.
     E assim todos viviam em paz e sem prejuízo, pois um roubava o outro, e este, um terceiro, e assim por diante, até que se chegava ao último que roubava o primeiro. O comércio naquele país só era praticado como trapaça, tanto por quem vendia como por quem comprava. O governo era uma associação de delinquentes vivendo à custa dos súditos, e os súditos, por sua vez, só se preocupavam em fraudar o governo. Assim a vida prosseguia sem tropeços, e não havia nem ricos nem pobres.
     Ora, não se sabe como, ocorre que no país apareceu um homem honesto. À noite, em vez de sair com o saco e a lanterna, ficava em casa fumando e lendo romances.
     Vinham os ladrões, viam a luz acesa e não subiam.
     Essa situação durou algum tempo: depois foi preciso fazê-lo compreender que, se quisesse viver sem fazer nada, não era essa uma boa razão para não deixar os outros fazerem. Cada noite que ele passava em casa era uma família que não comia no dia seguinte.
     Diante desses argumentos, o homem honesto não tinha o que objetar. Também começou a sair de noite para voltar de madrugada, mas não ia roubar. Era honesto, não havia nada a fazer. Andava até a ponte e ficava vendo a água passar embaixo. Voltava para casa e a encontrava roubada.
     Em menos de uma semana o homem honesto ficou sem um tostão, sem o que comer, com a casa vazia. Mas, até aí, tudo bem, porque era culpa sua; o problema era que seu comportamento criava uma grande confusão. Ele deixava que lhe roubassem tudo e, ao mesmo tempo, não roubava ninguém. Assim sempre havia alguém que, voltando para casa de madrugada, achava a casa intacta: a casa que o homem honesto devia ter roubado. O fato é que, pouco depois, os que não eram roubados acabaram ficando mais ricos que os outros e passaram a não querer mais roubar. E, além disso, os que vinham para roubar a casa do homem honesto sempre a encontravam vazia; assim iam ficando pobres.
     Enquanto isso, os que tinham se tornado ricos pegaram o costume, eles também, de ir à noite até a ponte para ver a água que passava embaixo. Isso aumentou a confusão, pois muitos outros ficaram ricos e muitos outros ficaram pobres. 
     Ora, os ricos perceberam que, indo à noite até a ponte, mais tarde ficariam pobres. E pensaram: “Paguemos aos pobres para irem roubar para nós”. Fizeram-se os contratos, estabeleceram-se os salários, as percentagens: naturalmente, continuavam a ser ladrões e procuravam enganar-se uns aos outros. Mas, como acontece, os ricos tornavam-se cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres.
     Havia ricos tão ricos que não precisavam mais roubar e que mandavam roubar para continuarem a ser ricos. Mas, se paravam de roubar, ficavam pobres porque os pobres os roubavam. Então pagaram aos mais pobres dos pobres para defenderem as suas coisas contra os outros pobres, e assim instituíram a polícia e constituíram as prisões.
     Dessa forma, já poucos anos depois do episódio do homem honesto, não se falava mais de roubar ou de ser roubado, mas só de ricos ou de pobres; e no entanto todos continuavam a ser pobres.
     Honesto só tinha havido aquele sujeito, e morrera logo, de fome.

(CALVINO, Italo. Um general na biblioteca. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.)

*gazua: ferro torto ou gancho, de arame, com a ponta chanfrada, utilizado para abrir fechaduras.

De acordo com o texto lido, escreva “V” para as afirmativas verdadeiras e “F” para as falsas:

(  ) Há uma inversão de valores no texto. A ovelha negra é o homem honesto: ele não se adapta e não se submete às regras daquela sociedade.

(  ) O título e o primeiro período do texto são exemplos de linguagem figurada.

(  ) O autor utilizou muitos pronomes indefinidos para designar seres e situações de modo vago, impreciso (ex.: todos, outros, poucos, alguém, algum, nada, tudo, etc.). Assim o leitor é levado a estabelecer relações entre o texto e a sua realidade.

(  ) “Ovelha negra” é uma referência irônica a todos os ladrões, porque eles só roubavam à noite, enquanto o homem honesto ficava em casa fumando e lendo romances.

(  ) A maior ironia do texto é que o único homem honesto daquele país morreu de fome, enquanto os ladrões sobreviviam e/ou progrediam.

Assinale a alternativa correta:
A
V, V, F, F, V.
B
 F, V, F, V, F.
C
 F, F, V, F, V.
D
V, F, V, F, V.
E
V, F, F, V, F.