Miró da Muribeca sempre está aqui
Um vento quente que vira furacão para sacudir o coração dos distraídos sopra do Recife. Atravessa fronteiras, inebria estudantes, acadêmicos, boêmios, trabalhadores que olham a cidade pelas janelas de ônibus abarrotados. A uma só vez personagens e plateia, eles ecoam em pensamento, voz e ação a poesia de Miró da Muribeca (1960-2022), que ganha biografia com lançamento previsto para o primeiro semestre de 2023.
Nascido João Flávio Cordeiro da Silva e que se encantou – para usar a fina expressão de sua terra – há pouco mais de um mês, são de Miró frases que se tornaram aforismos, como “merece um tiro quem inventou a bala”, e poemas que dissecam as entranhas brasileiras encharcadas de violência sem desistir da defesa de que, “apesar dos efeitos colaterais, o amor ainda é o melhor remédio”.
Seu legado, vida, memórias estão no centro da biografia que será publicada por editora de Pernambuco e que está sendo escrita por Wellington Melo. O trabalho trará “detalhes sobre a formação de um poeta que viveu desde 1985 exclusivamente da poesia e um relato também das suas contradições e das dificuldades de um poeta periférico, negro, que passou por preconceitos de diversos tipos”, conta à Folha Melo, escritor, editor, amigo e curador da obra do artista.
Os trabalhos completos do autor (tanto quanto possível, já que a oralidade com registros esparsos foi uma de suas marcas) também devem chegar às livrarias no ano que vem, com a inclusão de inéditos. Em uma entrevista à Folha de Pernambuco no ano passado, Miró comentou com entusiasmo que gostaria que sua biografia se chamasse “Ainda estou aqui”. Enquanto houver dor e injustiça – mas também beleza, irreverência e indignação para desvesti-las à clara luz do dia (e na solidão da noite) –, o poeta estará mais presente do que nunca.
Denise Mota
(Adaptado de Folha de São Paulo, 04 de setembro de 2022)
No segundo parágrafo, a palavra “como” tem o sentido de: