Menino Precoce
Sérgio Porto
Diz que era um menino de uma precocidade extraordinária e vai daí a
gente perceber logo que o menino era um chato, pois não existe nada mais chato
que menino precoce e velho assanhado.
Todos devemos viver as épocas condizentes com as nossas idades; do
contrário, enchemos o próximo.
Mas deixemos de sutis filosofias e narremos: diz que o menino era tão
precoce que nasceu falando. Quando o pai soube disso não acreditou. O pai não
tinha ido à maternidade, no dia em que o filho nasceu, não só porque não
precisava, como também porque tinha que apanhar uma erva com o Zé Luís de
Magalhães Lins, para pagar a “délivrance” que era quase o preço de um duplex,
pois a mulher cismou de ir para a casa de saúde do Guilherme Romano.
Mas isto também não vem ao caso. O que importa é que o menino já nasceu
falando.
Quando o pai soube da grande novidade, correu à maternidade para ouvir o
que tinha o menino a dizer. Chegou perto da incubadora e o garoto logo se
identificou com um “Oba”. O cara ficou assombrado e mais assombrado ficou
quando o belo nenenzinho disse: — Papai vai morrer às 2 horas! — dito o que,
passou a chupar o bico da mamadeira e mais não disse nem lhe foi
perguntado.
O cara voltou para casa inteiramente abilolado. Sem conter o nervosismo,
não contou pra ninguém a previsão do precoce menininho, mas ficou remoendo
aquilo. Dez e meia, onze, meio-dia... e o cara começou a suar frio.
Uma da tarde, o cara já estava suando mais que o marcador de Pelé.
Quando deu duas horas ele estava praticamente arrasado e quando passou
da hora prevista um minuto ele começou a se sentir mais aliviado.
E estava dando o seu primeiro suspiro, quando ouviu um barulho na casa
do vizinho. Uma gritaria, uma choradeira. Correu para ver o que era: o dono da
casa tinha acabado de falecer.
Adaptado de http://www.recantodasletras.com.br/cronicas/4078733