Mais assustadoras do que a cena do PM executando o ladrão são as seções de cartas dos jornais do Rio. Não surpreende que uma pesquisa de rua revele que a maioria concorda que o bandido tem que morrer mesmo. As opiniões da rua são espontâneas e emocionadas, algumas talvez não resistissem a uma reflexão. A enquete popular também proporciona o mesmo tipo de anonimato e dispersão de culpa que anima um linchamento. As pessoas estão impacientes e com medo, o bom senso é vítima da mesma miséria que vitimou o ladrão e seu executor. Mas as cartas aos jornais defendendo a execução são de indivíduos que refletiram e assinaram embaixo. São de brasileiros que pertencem a algumas minorias concêntricas
– alfabetizados, leitores de jornais, articulados – que deveriam pelo menos se prevenir contra o simplismo. Mas eles organizaram seus argumentos, montaram suas frases, cuidaram da pontuação, dobraram a carta e botaram no Correio e em nenhum momento a incongruência do que faziam os deteve. Estavam usando o privilégio do pensamento e da palavra para dizer que autorizam e aplaudem o estado assassino.
(...)
Vivo das palavras escritas. Tenho por elas, até as mais feinhas, um carinho paternal. Não gosto de vê-las usadas assim. No fundo é ciúme.
(Luís Fernando Veríssimo)
Com base no trecho “Mas eles organizaram seus argumentos...”, assinale a única alternativa que NÃO apresenta sinônimo da palavra em destaque: