Homem-sanduíche é uma designação muito expressiva para aquele que anda ou estaciona na rua encaixado entre duas placas publicitárias. Além de denotar essa posição de recheio humano, a expressão pode ainda lembrar o quanto valerá um dia inteiro desse específico trabalho: um sanduíche, ou quem sabe dois.
A primeira vez em que me deparei com uma dessas figuras híbridas do humano com a coisa, li no cartaz: COMPRO OURO. Olhei para o homem, para seu chapéu velhíssimo de sol e chuva, para seus sapatos deformados em t antas pisadas, para as barras das calça puída, para seu rosto de velho, com expressão de cansaço e vazio – e nada entendi. Por segundos, imaginei que exótica personagem era aquela, comerciando ouro fantasiado de pobre. Então rapazinho do interior, trazendo comigo a ingenuidade de outras e mais amenas rotinas, demorei um pouco para entender a função do ensanduichado: não ser mais que uma placa com pernas, disposta a conduzir algum cliente à pessoa do verdadeiro comprador. Quem tivesse, por exemplo, uma aliança, corrente ou anel, para vender com urgência, que o seguisse por alguma escada sombria.
Muitos anos mais tarde, certamente menos ingênuo, deparo-me com essa nova atração dos homens-sanduíches: entre dois cartazes de papelão, anunciam empregos, neste tempo de desemprego. Por isso, mal pude vê-lo no meio de uma cerrada roda de interessados: foi preciso aproximar-me, curioso, para reconhecer indicações de alguns postos de trabalho, oferecidos à pequena multidão, que anotava como podia alguns endereços. Como ele se mexesse, pois afinal estava vivo, alguém pediu: - Quietinho, tio, que eu quero anotar...
Comprando ouro ou oferecendo emprego, o homem-sanduíche nada compra e nada oferece por si mesmo: seu corpo é um suporte móvel para o mercado alheio. Alugá-lo é por certo mais barato que contratar um pedaço de parede, é mais prático que disputar um lado de coluna. O homem-sanduíche, invenção do homo sapiens, é uma das provas vivas de que falta alguma coisa em nossa sabedoria.
(Celso Oliveira)
“Nada entendi”- diz o autor do texto no segundo parágrafo. Essa declaração prende-se às seguintes causas:
4.1 - A mensagem do anúncio era contradita por índices da pobreza de quem anunciava.
4.2 - Ainda rapazinho ingênuo, chegado do interior, tomara ao pé da letra o que dizia o anúncio.
4.3 - Desconhecia as razões da condição de quem lhe parecera uma estranha personagem.
Está correto o que é dado como causa em: