Questão
2024
FCC
Ministério Público do Estado do Amazonas
Agente Técnico - Administrador (MP AM)
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Atenção: Considere a crônica "Tartaruga de arrastão”, de Rachel de Queiroz, para responder à questão.

O caso deu-se aqui na Ilha, numa pescaria de arrastão. Da primeira redada veio um tal peixe que causou espanto: ninguém “podia crer que naquele côncavo de mar morasse tanto peixe assim. Havia de ser alguma piracema que ia passando; para lá de três toneladas de pescado foram apanhadas de uma só vez. Na segunda redada nada veio, ou quase nada — fugira a piracema ou fora toda colhida pela rede. Entretanto, no meio daquele quase nada apareceu um bicho estranho: uma tartaruga do mar. Tartaruga diferente daquelas fluviais que a gente conhece, tartaruga das profundezas salinas, meio peixe, porque em vez de pernas tem nadadeiras.

Primeiro ela se debateu e tentou de todas as maneiras furar a malha. Depois foi agarrada e atirada ignominiosamente na areia, de barriga para cima. Por fim puseram-na em posição normal: e ela, recuperando imediatamente a compostura, estou o pescoço enrugado e correu em tomo de si um olho temeroso. Não sei se os presentes compreenderam quanto havia de surpresa, terror e pasmo nos olhos da tartaruga. Muito pior que um bicho da terra pego numa rede: este pode estranhar a prisão, mas afinal continua dentro de um elemento conhecido, pisando chão, vendo árvores familiares, sentindo o cheiro da terra. A tartaruga não: para «ela, nascida e vivida no mar, aquela era a mais estranha, a mais inacreditável e terrível das aventuras. Para aquela tartaruga era o mesmo que seja para um de nós vermo-nos transportados subitamente, sem dano físico, até o fundo do mar. Imagine que estranho,que portentoso e medonho não parece. As caras desconhecidas de ignorados animais - no caso, homens. E todos, todos, canibais ou “pior que isso - pois bem sentia ela sobre o seu casco grosso, sobre a carapaça encaracada, o olhar doce e atento e cobiçoso dos comedores de carne.

A sorte da coitada foi ninguém chegar a um acordo sobre a forma de abatê-la. E sorte maior o fato de ninguém, pessoalmente, querer se responsabilizar pela carnificina naquela quinta-feira santa. Mas levaram-na para o galinheiro - que ignomínia, uma veterana dos sete mares a ser atirada entre as galinhas, na noite que deveria ser a última da sua vida; ela que decerto esperava Sepultar.se entre areias claras, nalgum maciço colorido de anémonas do mar. Mas felizmente para a tartaruga, incerto é o coração do homem. incertos, os seus impulsos. Tanto vai para um lado como para o outro, tanto procura devorar hoje o seu irmão bicho, como amanhã o festeja e liberta. O fato é que um coração se apiedou da tragédia e houve mão que abriu a porta da capoeira e encaminhou (a marcha rampante do bicho marinho em direção da praia, em direção do mar, sua pátria. Ela também não esperou arrependimento, não hesitou, não agradeceu. Cortou a areia deixando um rastro longo, penetrou na água como um barco a deslizar do estaleiro, mergulhou, emergiu, voltou a cabeça ainda assustada para aquele mundo sujo, escuro, inimigo, onde viviam os homens, onde esperava nunca mais voltar; e mergulhou de novo, abraçando toda a água que podia entre as nadadeiras abertas.

(Adaptado de: QUEIROZ, Rachel de. 100 crônicas escolhidas: um alpendre, uma rede, um açude. Rio de Janeiro: José Olympio, 2021)

A cronista recorre à figura de linguagem denominada hipérbole no seguinte trecho:
A
Primeiro ela se debateu e tentou de todas as maneiras furar a malha. Depois foi agarrada e atirada ignominiosamente na areia, de barriga para cima. (2º parágrafo)
B
Havia de ser alguma piracema que ia passando; para lá de três toneladas de pescado foram apanhadas de uma só vez. (1º parágrafo)
C
E sorte maior o fato de ninguém, pessoalmente, querer se responsabilizar pela carnificina naquela quinta-feira santa. (3º parágrafo)
D
Tartaruga diferente daquelas fluviais que a gente conhece, tartaruga das profundezas salinas, meio peixe, porque em vez de pernas tem nadadeiras. (1º parágrafo)
E
Da primeira rodada veio um tal peixe que causou espanto: ninguém podia crer que naquele côncavo de mar morasse tanto peixe assim. (1º parágrafo)