Banguê
Cadê você meu país do Nordeste que eu não vi nessa Usina Leão de minha terra?
Ah, Usina, você engoliu os banguezinhos do país das
Alagoas!
Você é grande, Usina Leão!
Você é forte, Usina Leão!
Onde é que está a alegria das bagaceiras?
O cheiro bom do mel borbulhando nas tachas?
A tropa dos pães de açúcar atraindo arapuás?
Onde é que mugem os meus bois trabalhadores?
Onde é que cantam meus caboclos lambanceiros?
Onde é que dormem de papos para o ar os bebedores
de resto de alambique?
E os senhores de espora?
E as sinhás-donas de cocó?
O meu banguezinho era tão diferente, vestidinho de branco, o chapeuzinho do telhado sobre os olhos, fumando o cigarro do boeiro pra namorar a mata virgem.
Nos domingos tinha missa na capela e depois da missa uma feira danada: a zabumba tirando esmola para as almas; e os cabras de faca de ponta na cintura, a camisa por fora das calças: "Mão de milho a pataca!" "Carretel marca Alexandre a doistões!"
Cadê você meu país de banguês com as cantigas da boca da moenda: "Tomba cana João que eu já tombei!"
E o eixo de maçaranduba chorando talvez os estragos que a cachaça ia fazer!
Cadê a sua casa-grande, banguê,
com as suas Donanas alcoviteiras?
Com seus Totôs e seus Pipius corredores de cavalhadas?
E as suas molecas catadoras de piolho, e as suas negras Calus, que sabiam fazer munguzás, manuês, cuscuz, e suas sinhás dengosas amantes dos banhos de rio e de redes de franja larga!
Cadê os nomes de você, banguê?
Ah, Usina Leão, você engoliu os banguezinhos do país das Alagoas!
Glossário − banguê: engenho de açúcar primitivo, movido a força animal.
(LIMA, Jorge de. Poesias Completas. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1974, v. I, p. 161-163)
O poema alude